26 março 2018

Travessia das Highlands Escocesas


“A terra pertence ao dono, mas a paisagem pertence a quem a sabe olhar.”


Edinburg, 04jul17

            O verde que envolve toda a área do aeroporto promete. É-nos recusada a subida no autocarro que vai para o centro da cidade, ocupam muito espaço, dizem os homens com uma pronúncia do norte. Dificilmente os entendo quando indicam uma alternativa. É a mão estendida numa direção que nos encaminha para o comboio de superfície. Para eles chama-se tram.

Não é em Edimburgo que começa a nossa travessia, mas justifica-se voar para a capital por vários motivos: o avião para Inverness demorava mais um dia a chegar ao destino e era importante termos as nossas caixas intactas e guardadas para o nosso último dia de viagem e retorno a casa; o rochedo enorme onde se ergue o castelo; toda a parte antiga da cidade onde as cores parecem despidas; e por tantas outras razões…

Inverness, 05jul17

O transporte de bicicletas no comboio para Inverness não é propriamente simples. Perguntam-nos se reservamos lugar? Respondo que a informação que tinha era que havendo cadeiras de rodas para embarcar, só presencialmente e no próprio momento da compra dos bilhetes é que saberíamos dessa possibilidade. Os funcionários da ScotRail, sempre prestáveis, com a ajuda dos walkie-talkies tentam desbloquear esta situação. São permitidas 3 bicicletas a bordo, mas não nos satisfaz porque uma já está reservada e não é nossa. Cresce a ansiedade, encurta-se o tempo. No timetable não aparece a indicação do número da plataforma. Todos os passageiros olham para cima a 45º, aguardam alguns metros recuados dos torniquetes. Entretanto já temos luz verde. Somos os únicos do outro “lado da barricada”. Estamos debaixo do painel eletrónico, quase não nos resta espaço para olhar na mesma direção dos passageiros. A 5 minutos da partida surge o nº16 que nos guia até ao topo do comboio.
Torna-se natural avistarmos muitos lagos ao longo do nosso percurso. Inverness, a capital das Highlands, situa-se orgulhosamente onde o lago Ness se junta ao mar. Saímos desta cidade e durante 40 kms devoramos asfalto. Mantemo-nos ao nível do mar, vamos desembestados à procura das Terras Altas. Rolar à esquerda é uma experiência nova. Quantos anos já passaram, quantos quilómetros já percorri no outro lado da estrada? A condução dos escoceses não nos tranquiliza, torna-se frequente subirmos o lancil, para, em segurança, avançarmos para o nosso destino.

Em Contin, na montra de uma loja, salta-me à vista o seguinte aviso: última loja antes de Ullapool (que dista de Inverness aprox. 39 kms pela A836). A nossa previsão aponta para 3 dias de bicicleta. A quilometragem por trilhos ultrapassa os 300 kms porque existem muitas zonas que queremos explorar mais a norte.

Os grandes horizontes aproximam-se, as paisagens dos quadros e dos postais ilustrados revelam-se. Todos os ciclistas sabem que as grandes voltas têm um preço, o espaço de terra que escolhemos para estacar a nossa tenda não está decidido, nem tampouco teremos como nos abastecer durante este longo período de isolamento. Será o cansaço, o tempo, bem como as condições e beleza do que nos rodeia que nos ajudará a estacionar a bicicleta.


Inicialmente, uns barracões junto ao riacho parecem um belo spot. Arrastamos placas de poliuretano, tapamos janelas e, o Nunes vai espreitar a casa que está alguns metros mais acima. A porta está aberta, tem gás, água, fogões, alcatifa, casas de banho, sofás, camas, etc. Ah!!! Tem tudo o que uma casa habitada normalmente tem, até televisão. Só existia um problema, não havia eletricidade, era preciso voltar ao barracão e ligar o gerador.


Qual foi o local que escolhemos para passar a noite? Deixo à vossa imaginação.

Lodge (algures num lugar da Escócia) -  Cabana do Pescador - 06jul17 - 115 kms

A beleza e o isolamento têm um preço. Para o Baleia e o Nunes, o café da manhã acompanha com uma barra energética. Cada um de nós transporta 4 pacotes de massa, não haverá fartura, nada sobrará, mesmo com momentos de mais contenção na “fome controlada”, julgamos ter comida suficiente para cruzar esta parte inóspita da Escócia.

Antes de entrarmos em novo loop pelas montanhas, obtemos um mimo e entrámos no bar do  Oykitel hotel para uma refeição quente. Se não gastamos na dormida podemos dar-nos a este luxo e fugirmos um pouco ao low-cost. Bem tentamos pedir para nos vendam um pacote de massa pois desta forma tínhamos uma forma de complementar e ter a certeza de que haveria comida suficiente para todos os dias. Não tivemos sorte, só havia produtos frescos. Fomos rolando e mais à frente, o Accknes hotel estava sobre o nosso track. Conseguimos um pacote de tagliateli cuja validade terminava em 2014. De certeza que seria bem pior se não comêssemos nada nos próximos dias. O manto verde do cenário é uma realidade independentemente do vale, da esquina ou dos quilómetros que percorramos.


Passa das 18h da tarde e também já ultrapassámos a centena de quilómetros. A cartografia do gps não augura nada de bom se continuarmos a insistir no avanço. Vasculhamos uma pequena casa e somos surpreendidos com uma bela reserva de vinho tinto australiano. A subida que se segue é feita a pé e os famosos midges não nos largam quando paramos para tentar fazer um chá. Que cenários dignos de serem apreciados temos em linha de vista assim que cruzamos a montanha. Seguimos apaixonados por esta região, por agora, procuramos abrigo. Aproxima-se outro lago, numa das suas margens vemos uma pequena casa de madeira. A cabana dos pescadores tem gás, chá, mas o melhor é mesmo ter um teto que nos permite mais uma bela noite.




Cabana do Pescador - Oykitel brigde Hotel - 07jul17

Tal como disse dias antes para a câmara de vídeo, olhando para o céu, não sei se é “a.m. ou p.m.” Deitamo-nos de dia e acordamos de dia. Ontem a garrafa de vinho de caubernet sauvignon trouxe outro fôlego à nossa habitual ementa de massa. O sabor alterna entre a carbonara, o pesto ou a bolonhesa e neste momento ao pequeno-almoço, resolvemos alternar. As grandes canecas de café mantêm-nos sóbrios e deixam-nos a certeza de que não estamos a sonhar. Estes locais de extrema beleza existem no nosso planeta, temos é que pedalar para conseguir alcançar alguns deles.

São 22h00, continua a haver bastante luz e “fortes bandos” de midges à solta. Nós estamos em busca do barracão onde funcionava a antiga escola e onde é permitido o alojamento a mochileiros. Tentámos um motel com B&B algumas milhas bem atrás, estava cheio. Neste momento estamos no Oykitel hotel, foi neste local que parámos há 2 dias atrás antes de iniciarmos o loop pelas highlands. Nesse dia aproveitámos para avisar familiares (devido à nossa ausência de notícias e contatos telefónicos), pois só aqui no hotel era possível termos cobertura para o telemóvel.
Agora, é preciso recuar umas boas horas e colocar em palavras algo que não se resume a 15 kms sobre pedras, lodo, riachos, montanhas, terrenos alagadiços e um caminho que teimava em não se deixar ver. Foi necessário navegar com o gps seguindo a cartografia carregada e obtendo por vezes ajuda com os montes de pedras que indicavam um ponto de passagem.


Esta nossa aventura tem por base um track de bikepacking. Lonkinver é uma pequena povoação junto à costa. Como é um dos poucos locais habitados que visitamos, compramos comida para logo ali, junto do parque infantil, fazermos um snack muito diferente das massas a que nos fomos habituando. Eram 16h00 e estávamos longe de imaginar a tortura que iriam ser os próximos quilómetros.  Não faltavam áreas lindas pelo caminho nem horizonte para percorrer. Sempre ladeados pelo lago Fada, o nosso passo era lento e a bicicleta permitia ser empurrada. Ora sobre pedra, ora enterrando as rodas até aos cranks e as pernas até aos joelhos, foi uma longa caminhada durante 5 horas.


Oykitel brigde Hotel  - Shenavall shelter ( que afinal não era abrigo mas sim uma casa em ruínas) - 08jul17

Neste território mais a norte da Escócia por vezes somos abençoados com algumas estradas de ligação em alcatrão. Têm só uma faixa de rodagem e é normal os carros percorrerem-na ocupando toda a via. Espaçadamente surgem pontos (passing áreas) para que os carros se possam cruzar. Nós sentimos a vulnerabilidade quando os condutores escoceses não abrandam e nos momentos em que entramos nas curvas.


Não foi um dia fácil, a saga de muitos trilhos com pedra continuou. A chuva não dava tréguas, a paragem em Ullapool para o fish and chips serviu não só para nos alimentar, mas também como pequeno conforto neste dia tão frio. Daqui a ideia era seguir para um shelter situado bem afastado da costa e que serviria de local de pernoita.
Com o vento a bater forte, os olhos sofriam com tanta água. Depois de muitas horas a pé, surge do outro lado a descida alucinante que permite ver no vale uma bela construção com 3 chaminés. Estranhei não estarem a deitar fumo, e estranhei ainda mais quando o Baleia e o Nunes (que iam à minha frente), cirandavam pelo exterior da casa.


Pensei logo – as portas estão fechadas. Parte da casa estava em ruínas, eram bem visíveis os estragos que a colocavam em risco de ruir e por isso, portas e janelas estavam trancadas com tábuas de madeira. Tendo como opção as tendas gore-tex que transportávamos e esta amostra que já foi casa, elegemos a segunda para nos protegermos dentro de paredes. Recolhemos água da chuva que cai das caleiras, parece um contrassenso pois existe ribeiras e lagos com água maravilhosa por todo o lado, no entanto, chove mesmo muito para que façamos meia dúzia de metros até ao ribeiro. Não quero descrever o interior para que ele se desvaneça com o tempo da memória. Há vestígios de marca humana, quantos mais aqui decidiram ficar em tempos?


Shenavall Shelter -  Carnmore bothy (Barn, Celeiro) - 09jul17



Impressionante. Percorremos uns míseros quilómetros e surge novamente o waypoint do abrigo. Aproximamo-nos, este sim deveria ter sido o nosso poiso ontem. Abastecido com sacos-cama, botijas gás, esteiras, etc, este espaço estava em ótimas condições. Ontem, com o excesso de confiança, o entardecer da hora que se aliou ao cansaço acumulado e à muita chuva, originou que não confirmasse a nossa posição no gps. Vinha a navegar com zoom a 300 metros e este waypoint parecia tão perfeito no meio do nada. Como imaginar que haveria 2 casas tão próximas? Resumindo, a casa em ruínas com a placa KeepOut deveria ter outra palavra, quem sabe a dizer KeepGoing.
O entulho nesta casa fazia lembrar uma pista de obstáculos, provavelmente por isso a nossa saída foi feita perto das 11h. Prosseguimos em caminhos com pedra ou água até chegarmos a mais um lago. O lago parecia maior, o caminho estava interrompido, a água recuou e apanhava bem parte do braço do rio que o alimentava. A travessia na posição do caminho que apontava o track estava fora de hipótese. Subimos o curso do rio até uma zona confortável para efetuarmos a travessia em segurança. Não havia mais surpresas, o caminho fazia-se caminhando. Literalmente!!!

Mais um vale que se espraia à nossa frente. Visto de cima sabe a conquista. Daqui em diante, quando pensas que o panorama não pode melhorar, surgem 3 enormes lagos. Falta muito pouco para mais um abrigo, já se via a tabuleta de madeira com uma pequena frase “mountains and hickers are welcome to the barn 200 yards past the house. Era o Carnmore bothy.
Estes abrigos - alguns são simples, tendo, quase sempre, o essencial - estão em zonas remotas para uso de todos os que amem lugares lindos e isolados. Quantos de nós abdicam da liberdade de escolher? De nos levantarmos de manhã e gritarmos liberdaaaaade, tal como o William Wallace?


Carnmore bothy -  Bunk house (kinlocheme) 10jul17 – 50kms

O dia de ontem teve apenas 16 kms mas custou-nos um dia. Este é um exemplo que os percursos não devem ser só avaliados em termos de quilometragem ou acumulados de subida.
Hoje conseguimos pedalar grande parte do dia. Os single-tracks conduziram-nos até uma zona de floresta que ladeia as poucas casas de Poulewe. Encostada à cerca está uma bicicleta parada, pertence à mochileira com quem nos cruzámos há 2h atrás. Ela bem disse que a teria deixado ali, no fim daquela mancha verde. Para nós, era o inicio de um caminho tranquilo. Abastecemos nesta vila, dissemos olá, estamos bem para quem amamos no nosso país e ainda tivemos tempo para cozinhar bacon com ovos. As saudades eram muitas, e não é só da família a que me refiro.

Quando nasce uma oportunidade de desviar por alcatrão para Kinlochewe, sentimos que queremos mais. Temos gula, absorvemos e estamos viciados nesta adrenalina gerada por tanta excelência. Gastamos 3h para o tothie path (um preço justo para 10kms), que nos mostra mais uma margem de um lago e de como este país tem pedras e rochas. Já na estrada, vamos num autêntico contra-relógio para chegar ao bunkhouse. É aqui que vamos lavar roupa, cozinhar, carregar baterias, fazer um update nas redes sociais e um sem número de coisas que quem viaja em autonomia tão bem conhece.

Kinlocheme (bunkhouse) – Eilean Castle - Broadford (Skye basecamp) -11jul17

Podia escrever, de manhã, pela fresca (mas aqui é sempre fresco e quase sempre dia), seguimos na direção das montanhas de Torridon. Enquanto os automobilistas conduzem ao longo da estrada com uma única faixa de rodagem, quem sabe, a ouvirem bagpipes ou música celta no rádio, nós vamos atentos ao desvio que nos levará pela primeira vez a um caminho marcado para bicicletas. Tudo corre bem durante uma dezena de quilómetros, altura em que, junto de uma pequena floresta, voltam os caminhos de pé posto. Olho a cartografia, olho as opções e comunico que seria melhor desviarmo-nos para o outro caminho que seguia pelo sopé da montanha e nos levava à estrada um pouco mais acima do track. 
Segui sozinho, prefiro pedalar, exceto se o spot estiver num local inacessível, então chego lá nem que seja com a bike às costas. Não era o caso. Seguimos em 2 grupos por caminhos diferentes e ficou combinado o encontro na próxima povoação.
Cheguei primeiro ao hotel - este afinal marcava a tal povoação - bem em cima da linha do nosso track. Sem comunicações, esperei. Questionei a 2 trabalhadores (adorava escrever aqui as expressões e a pronúncia desta gente. Autênticos “mates”), se tinham visto 2 ciclistas. Num discurso que me fez lembrar as séries inglesas muito antigas sobre a ruralidade desta ilha, percebi que talvez tivessem seguido em direção ao supermercado que ficava a 4 milhas noutra direção. Caminhei um pouco até obter um sinal mínimo de cobertura no telemóvel, liguei e enviei sms a indicar que o nosso próximo ponto de encontro seria o famoso castelo de Eilean.


Por telemóvel, algumas horas depois:
- Ricardo, estamos a 1km da ponte de Skye. Onde estás?
- No Castelo, a ponte que vês não é a de Skye mas a que liga ao castelo.
Desligamos. Esperamos em ambos os lados, nada acontece.
Volto a ligar.
- Não chegaram ainda?! Impossível terem passado por este spot e não o verem. Era como se passassem em frente da Torre de Belém e ela passasse despercebida - pensei.
- Qual castelo, não vejo castelo nenhum.

Conclusão, na intercessão dos 2 tracks eu virei à esquerda e o Nunes e o Baleia foram para Skye. Efetivamente quando me dirigi para eles e observei a ponte gigantesca, não tive dúvidas, ali era a passagem para a outra margem. A estrada é movimentada, os hostels, albergues, hotéis e B&B sucedem-se e todos têm lotação esgotada. Nesta temporada há muitos turistas por aqui - comenta comigo o rececionista do Youth-Hostel.
Bem no início, já do lado de lá da ponte, vimos o Skye BaseCamp (com 3 vagas disponíveis). Pediam 25£ pelo dormitório e como o preço não nos agradou, fomos tocando de porta em porta até acontecer o que descrevi no parágrafo anterior. Já afastados de Broadford, no hostel de backpackers (colado a uma funerária), fizemos a mesma pergunta. A resposta foi negativa acrescentando que podíamos colocar a tenda no exterior por 9£. Declinamos e a simpatia deste rececionista - que conhecia o Alvor e a praia da Rocha porque aí tinha começado a sua volta ao mundo em veleiro - ligou para o Skye Base Camp.
Do outro lado da linha:
- Estamos cheios. Vendemos há 10min. as últimas 3 vagas.
Voltei atrás no tempo e lembrei-me da minha conversa com a rapariga do Base Camp. Na altura disse-lhe que não havia problemas de partilharmos o dormitório com a miúda que já lá estava, e o mais importante foi:
- Wait. I will call my friends.
Saímos de um hostel ofegantes e chegamos ao outro hostel ofegantes. Correu bem, não foi preciso sentirmos mais este vento (que é mais forte e gelado, pelo menos por agora).

Broadford (Skye basecamp) -  Portree - Old Man of Storr- Broadford (Skye basecamp) - 12jul17
Mesmo sabendo que a meteorologia na Escócia é temperamental e que podem surgir as 4 estações num dia (a verdade é que raramente vimos o sol), a exceção aconteceu hoje e o astro esteve connosco em toda esta ilha de Skye. Enjoamos de asfalto. Vêm-me à memória a frase “o alcatrão faz mal aos pulmões”. Largamos amarras do Skye basecamp para, sempre pela costa, podermos atingir o local mítico Old Man of Storr, e quem sabe desfrutarmos de uma caminhada.


O fluxo automóvel é uma constante, em Portee as ruas estão apinhadas de gente e a cidade não convida a ficar. Bem longe e já se avista o maciço montanhoso. Reza a lenda que alguém ali escondeu um tesouro e que o fez na base de Storr para não se esquecer do local. Carros abrandam, autocarros param, as pessoas saem em fila indiana e, de máquinas em punho, registam o momento. É um dos locais mais fotografados do mundo, presumivelmente porque alguém criou uma aura de misticismo em torno de Storr. A nossa opinião é unânime, a montanha pariu um rato. Abrem-nos o portão e a cada metro que andamos, somos o centro das atenções. Os turistas vibram. Os que estavam a descer, olham para trás; os que são ultrapassados na subida, param. Atingimos o nosso topo, não havia necessidade de ver mais pois tínhamos todo o caminho inverso para percorrer.
No frigorífico do hostel ainda estavam os 2 tupperwares de arroz que sobraram ontem (nem com a etiqueta a indicar “free” lhe tocaram). Estava-nos destinado.


Broadford- Malaig- Fort William -13jul17
Hoje era dia de abandonar Skye. Ficámos pela metade da quilometragem planeada para esta ilha. Um dia, quem sabe, um de nós com um veículo a motor junta-se a esta multidão de turistas.

Havia uma opção alargada de horários para aproveitarmos o ferry que nos levaria a Malaig. A partir desta vila piscatória seguimos por uma cénica estrada costeira abraçada por praias de areia branca. É uma zona de veraneio, mas a verdadeira questão é que ninguém sai das caravanas. O sol não faz parte dos postais ilustrados da Escócia. Nós aproveitamos para o nosso chá acompanhado de bolachas. 
Alguns minutos depois voltamos à estrada para rolar sem abastecimentos durante mais de 80kms. Em determinada altura digo ao Nunes para fazermos uma paragem na próxima povoação. Eles, na sua roda 29, voam e acabam por não perceber que um Lodge é quanto baste para identificar um local. Estacionei a bicicleta, aproveitei para comer e proteger-me da chuva. 
Já percebi que a regra de ouro por aqui parece ser. Não tenhas tanta pressa. E não faz diferença se viajas de carro, moto, a pé ou de bicicleta. As distâncias no terreno parecem maiores que em qualquer outra parte da Europa. Esta é uma viagem lenta no seu melhor, aproveita-a. Sozinho tens mais tempo para observar, o belo não reivindica por atenção e por isso precisas de ir bem atento.

Antes de avistar o colorido e o contraste de dezenas de pessoas numa colina (no Tour de France é normal esta imagem), presencio outros episódios curiosos. Várias pessoas estão, numa atitude de conquista e vitória, a estacar a bandeira da Escócia numa posição elevada. Respondem ao meu aceno e colocam todos as mãos no ar em sinal de empatia para com um viajante que se equilibra em 2 rodas. Quilómetros depois, diversos autocarros e carros estacionados suscitam a minha curiosidade. Afinal esta gente estava só plantada na colina para ver o famoso comboio a vapor do Harry Potter ou haveria mais razões para tal acontecimento?

Neste vale ergue-se uma bonita ponte com vários arcos. A qualquer momento irá passar o comboio, foi também neste lugar que alguns séculos atrás se travou uma batalha. A Escócia começou aqui.
As ciclovias bem marcadas começam a aparecer e Fort William cativa desde que se avista esta cidade no sopé de Ben Nevis (a montanha mais alta do Reino Unido com 1300 metros). Cheguei tarde, a chuva mantinha-se e o frio apesar de não incomodar ainda, fazia-se notar. Encontrei a rapaziada no Macdonald´s a comer. Fizemos várias pesquisas sobre vagas em alojamentos antes de nos lançarmos para o malagueiro que estava lá fora. Foi à primeira que arranjámos um hostal para ficar. Em pouco tempo percebemos que o grupo a seguir a nós já não teve a mesma sorte. Em conversa com a dona do estabelecimento percebi que as pessoas nesta altura estão a abandonar a tenda pois estão cansadas de tantos dias húmidos, com chuva e frio. Com banho quente tomado, roupa seca vestida e consigo entender ainda melhor a decisão deles.


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Fort Wiliam- Fort Augustus-Inverness - 14jul17

Há vários dias que o Nunes e o Baleia vinham a salivar com o bike park de Fort Wiliam. Hoje era o dia para eles explorarem a adrenalina das descidas enquanto eu saía da intitulada Capital do Outdoor, para chegar também à capital, mas das Highlands, Inverness. 

Aproveitei para conhecer melhor a Route 78 (Caledónia Way), um casal de ingleses (com bicicletas ainda mais carregadas que a minha) e 2 raparigas que descobri serem portuguesas assim que ouvi uma palavra na língua de Camões. Entabulei facilmente uma conversa com estas pessoas com quem me cruzei. Isto também é viajar.


Percorrer o Great Glen, a fissura geológica que rasga a região desde Fort William até Inverness pelo lago Ness, divide a Escócia e onde assenta a Caledónia Way é sentir uma combinação de diferentes paisagens e pavimentos desde os canais com as eclusas, os single-tracks em florestas cerradas e as ciclovias. 

Partilho alguns destes caminhos com outros ciclistas e caminheiros até Fort Augustus, outra cidade que é estrangulada por tanto turismo. Daqui em diante, a single-track road é partilhada com carros. É impossível não frisar o silêncio e a tranquilidade que envolve tudo em redor dos lagos. A beleza da arquitetura das construções de madeira dá muito mais sentido à imagem que temos de uma casa no lago.

Sair de Fort Augustus exige uma pulsação elevada, pouco tempo depois, dá-me um gozo enorme desfrutar de tanta velocidade. É espontâneo o meu grito de liberdade registado na gopro e é notório que os automobilistas percebem a minha euforia.


Fico ao lado do Loch Ness após ter virado à esquerda na direção das Foyer Falls. Existe aqui uma cascata que merece uma pausa e nada melhor que um gelado artesanal para saborear o momento. Faltam 20 milhas tranquilas, a N78 continua a manter intacta a minha paixão pela natureza. O céu está sombrio, não é novidade nem nada de novo. Ter dificuldade em arranjar cama também não é novidade. O City hostel é a minha terceira oportunidade para ter mais comodidade pois consta que na cidade de Inverness vai decorrer este fim-de-semana os Highland Games.




- Não tens reserva, não tens cama – era a frase mais ouvida.
O Ali, o rececionista do hostel é indiano, sabe perfeitamente como gerir cada metro quadrado desta mina de ouro. Explica-me detalhadamente os procedimentos para que possa ficar confortável. Dá-me o código da cave para colocar a bicicleta no porão e permite que deixe os alforges junto a ele no exíguo espaço - que serve de receção, de lavandaria e também de arrecadação – e indica-me o local onde vou dormir. Só o balcão nos separa. É na sala de convívio e jantar que me vou juntar a 7 mochileiros. Agora, estão muitos mais e nem conto com aqueles que chegam ao lobby para fazerem o check-in. Escrevo e mantenho os tampões nos ouvidos, a azáfama é grande e as portas só fecham às 00h00, depois, só os eleitos terão direito a colocar o saco-cama no soalho de madeira.

Inverness - Aviemore - Bothy Inshriach – 15jul17 – 43 kms

Passavam muitos minutos da meia-noite ontem, os saco-cama já estavam estendidos ao longo da cobertura dos sofás que bordejam esta área comum do hostel. As mesas de bilhar mantêm-se no mesmo sítio e quando já tenho tudo espalhado, a rapariga loira chama-me. Era a rececionista que deve ter adorado o visual de eu estar com os calções da piscina vestidos e diz-me que tem uma cama livre.
- Quem a reservou, a esta hora, já não vem. Disse-me.
Should I stay ou Should I go? questionei-me. Era tanta a tralha que tinha de enfiar nos alforges, sabia que não cabia sem estar tudo bem arrumado e ainda tinha a acrescentar os sacos de comida. Demorou, subi ao 3º piso, abro pelo menos 3 portas corta-fogo e chego a um quarto cheio de beliches. Com a pouca luz que entrava pela frecha da porta entreaberta, aproximo-me de algumas camas. Ups!! Apalpei alguém. Por sorte, está um noctívago a teclar. Digo-lhe que procuro uma cama livre, responde que a de cima está desocupada e rapidamente tira todas as suas roupas de lá. Sou mais uma sardinha enlatada. No momento, juro que pensei em voltar a descer para perto da mesa de bilhar.

Já é dia, receio estar a dormir à várias horas porque sinto-me revigorado. Afinal foi apenas uma sensação. São 06h30, concluo que o bem-estar físico se deve às hormonas do frango inteiro que comi ontem ao jantar. Devido às circunstâncias, fui forçado a estar muitas horas acordado. Tive então a oportunidade de ajustar o planeamento para os próximos dias antes de apanhar o avião para Portugal. Bate tudo certo, no dia 14jul, na etapa 10, estava precisamente em Inverness conforme o previsto.



Para evitar um pouco de estrada até ao Parque Nacional de Cairngorms, vou apanhar o comboio até Aviemore e começar aí nova odisseia. Voltar à estação dos comboios de Inverness 10 dias depois, conhecendo e sabendo o que está para lá daqueles cumes, mesmo com todo este cansaço acumulado, o pensamento persiste: não há nenhum livro ou filme que substitua o que estou a sentir neste país.
No intervalo que me resta até à hora de embarcar, faço o meu périplo pela cidade de Inverness agarrado à gopro, máquina fotográfica e é bem junto ao City Hostel que encontro o Nunes e o Baleia. Estavam encharcados, tinham saído muito cedo do barracão onde passaram a noite e ainda precisavam de comer algo. Conversamos e surge novamente uma visão diferente da minha. Segundo eles, não vai ser possível pedalar pelas montanhas do Cairngorms Park pois estiveram a ver o percurso pelo Google Maps e por essa razão vão de comboio até Edimburgo. Recuando 24h, quando me cruzei com o casal de cicloturistas do sul de Inglaterra, ele dizia-me que os ingleses usam muito uma palavra. “Have faith”. You must have faith. Esta fé que tenho, não move montanhas, mas ajuda-me incondicionalmente a passar sobre elas. O meu veredicto é sempre depois do resultado, se receasse tanto, não andava de bicicleta por estes sítios. No entanto, compreendo a posição deles pois tínhamos começado esta viagem em autonomia pela região mais dura e foram as Northwest Highands que indiscutivelmente nos marcou mais fundo.


Aviemore é uma vila voltada para a montanha. A maioria das lojas foca-se nesta vertente desportiva. A viagem de comboio durou 1h e poupou-me 55kms (na maioria por estrada) e é quando saio da estação que cometo um grande lapso. Ia com a povoação de Carrbridge na cabeça e é para lá que sigo. Dirijo-me para norte, sou atraído pelo magnetismo, tal como gira a agulha da bússola.
As montanhas ficam nas minhas costas e em pouco tempo estou a rolar na National Cycle Network 7, uma estrada tranquila que me leva até à ponte do séc. XVIII e parece ser a atração deste sítio. Observo um grande parque aventura e salta-me à vista os escorregas de água como se fosse também um parque aquático.
Está um dia ventoso, com chuva, nada que me surpreenda nesta latitude. Fico espantado. Pior fiquei quando a placa com a indicação Inverness me surge pela frente. Rolei 10kms em sentido contrário, já não estava espantado, sentia-me danado. Não existia alternativa, tive de percorrer a mesma estrada até Aviemore. Parei numa das muitas lojas de equipamento de montanha para colocar algumas questões. Mostrei o track no gps e interroguei sobre a dificuldade do percurso. A fila ao balcão aumentava e as cartas militares para verificar o itinerário estavam abertas sobre ele, sentia-me agora em casa. Absorvi cada traço, cada linha inscrita maquelas quadrículas, era exequível o meu plano. Agradeci e fui à procura de local para pernoita.

O youth-hostel e o bunkhouse estavam completos (penso que havia mais uma festa na terra) e nisto dizia um escocês que devia ter planeado. O troco que levou foi que, nas highlands em bicicleta, as coisas nem sempre correm como planeado. Dali fui até ao posto de turismo para receber informação completa sobre a meteorologia nesta região. Estava convencido a atravessar o Parque Nacional e precisava de estar precavido. Entretanto, no gps, sem sucesso, tento verificar quantos quilómetros são até Pithlochy ou Perth? Não é possível calcular a rota, agora, quando olho os mapas percebo porquê. A A9 é interdita a bicicletas. Há 2 opções, seguir no comboio ou cruzar as Cairngorm Mountains e seguir o rio Tilt pelo pass de Killiecrankie.
Good weather para amanhã e depois. Coloquei dentro dos alforges mais uns enlatados, pão e abastecei de água (no supermercado a menina indiana queria que comprasse água. Hello!!! Não falta água na Escócia, já meti tantas vezes os bidons nas ribeiras. Já me lavei neles.), agora é só tirar as tampas dos bidons e aguardar uns minutos pois não pára de chover.
A mancha verde que cobre as ondulações à minha frente não tem semelhança com outro local onde tenha passado. A reserva do Parque Nacional de Cairngorm é a maior do Reino Unido e merece o meu último esforço antes de sair da Escócia. Entranho-me no bosque florestal, são muitas as bicicletas que vejo a circular e é a um ciclista que pergunto o melhor caminho e qual o seu estado de conservação?
- Qual Bothy? Há tantos por aqui.
- Vou para Inshriach.
- Não tens problema, é tranquilo.
No meio de tantas dúvidas, de tanto tempo indeciso, penso que só não faz quem não tenta, quem não ousa ou como está escrito na manga do casaco que me aquece “Eu pedalo para vencer.”

Chego mais facilmente do que imaginava ao bothy. É literalmente uma cabana no meio do bosque. No interior existe um beliche e alguns jerricans que já estiveram cheios. No total não têm mais que um copo de água e é com esta quantidade que faço a minha higiene. Mais tarde, disponho sobre a cama toda a comida que trago comigo, preciso avaliar, distribuir as porções e saber o que posso comer hoje.



Bothy -Blair Athol-Perth ( de comboio até YH) -16jul

            Todos os caminhos na Escócia deviam ser como os que encontrei nestas montanhas. Há zonas duras, muito técnicas sem ser necessário empurrar a bicicleta, no entanto, tem muitos single-tracks e não existe aquela quantidade bíblica de pedras a cada metro.

Os primeiros 30kms foram suaves entre o frondoso bosque. Abasteci num gliding park (zona de lazer para se divertirem na neve), altura em que se partiu um raio da roda da frente. Como não parecia muito empenada, resolvi continuar. Tive um momento em que julguei o conta-quilómetros avariado, a distância no mostrador parecia não aumentar. Lembrei-me que a pé andava a 4km/h e nos momentos em que conseguia sentar-me no selim, não passava dos 6km/h. Era sem dúvida um problema de velocidade.


Perdi a conta às vezes que cruzei o primeiro rio que acompanhava. A água gelada por vezes tocava os joelhos. Precisava levantar a bicicleta e também escolher sempre o melhor local para a travessia. Comecei a cantar uma música cujo ritmo hoje está na moda. “Passinho a passinho, bem devagarinho, eu vou cruzando, as montanhas da Escócia. Estou a levar uma coça.” Centenas de passos depois eu continuo noutro registo. “Passinho a passinho, bem devagarinho, eu vou molhando os pés nos rios da Escócia.”
Pedalo há várias horas num single-track situado a meia encosta. À minha frente forma-se um desfiladeiro imenso, as cores são puras e sobressaem pela sua frescura. Estou entrincheirado no meio de 2 montanhas e sigo a corrente do rio Tilt que me levará para zonas mais planas.


Já comi quase tudo o que levava do dia anterior. Restavam algumas fatias de pão que podiam entrar como único recurso. O cansaço já era grande e felizmente o caminho a 10kms do final melhorou imenso. Só o vento que sopra de frente consegue ter intensidade para corroer o corpo.



A meteorologia mantém-se estável com boas abertas de luz. Vou avançando para mais perto da civilização e eis que começam a surgir muitos betetistas para aproveitar estes trilhos e pontes metálicas que servem de apoio para cruzar as secções mais complicadas do rio (algumas datam do ano 1900). Ao final da tarde surgem os portões metálicos dos jardins palacianos de Blair Athol e regozijo-me com toda a estética envolvente. Sinto prazer, deleite, satisfação, exultação. Que a força colossal destas palavras tenha em vós o mesmo impacto que senti neste local. Esqueci-me de dizer que também tinha uma fome incrível e a minha prioridade era comprar comida para recuperar depressa.



Perth (YH) - Forth Bridge - Edinburg - 17jul
Falta um dia para acabar esta aventura, por pouco não acreditava que iria usar os óculos de sol e o protetor solar. Larguei a bela suite com casa de banho privativa onde descansei a noite passada no YH de Perth e parti estrada fora.
Por vezes criam-se condições que no fazem equacionar, reajustar, e provavelmente de um momento para o outro alterar  as diversas opções que já se haviam tomado. Eu explico: há 2 dias, quando saía do bothy no meio da montanha equacionava chegar a Pithlochry e apanhar o comboio para Edinburgh porque tudo apontava que o caminho ia ser desinteressante. Sem o camping gaz (quem tinha o bico era o Baleia), ao jantar no bothy comi apenas um enlatado, algum pão, banana, doce e queijo. De manhã consegui comer granola com água e ao longo do dia foram-se as bolachas, os chocolates bounthy e pouco mais.
Quando cheguei a Blair Athol estava desgastado, nem pensar em chegar até à próxima cidade, o melhor era mesmo fazer a ligação de comboio. Entrei na primeira -  e talvez a única loja -  que por sorte estava aberta ao Domingo e abasteci. Na plataforma dos caminhos de ferro espalhei roupa para secar e comi enquanto aguardava a chegada do comboio. De barriga cheia, o pensamento claro vinha até mim e achei que o melhor era seguir já para a Capital. Liguei ao Baleia para me reservar um quarto no mesmo hostel onde estavam em Edinburg.
Conferi a ligação de comboio, tinha de fazer um transbordo em Perth porque este era o último e ia para Glasgow. Isto significava chegar às 22h30 à Capital da Escócia, era muito tarde para quem já estava no meu estado. Fiquei alojado no youth-hostel em Perth. À chegada, enquanto fazia o check-in dialogo com os residentes e questionei a viabilidade e beleza do trajeto até Edimburgo. Não seria melhor ir novamente no comboio da manhã (que provavelmente iria cheio de pessoas para irem trabalhar) até à estação de waverley? – pensei.
- Não podes perder a Forth Bridge. As estradas são todas secundárias, se estiver bom tempo, aproveita e vai a pedalar.



A decisão foi adiada para o dia seguinte, dependeria muito de quanto o meu corpo recuperasse da fadiga. A proteína era essencial para reconstruir músculo. Comi salmão fumado, uns bons bifes do lombo, guarnecei com sopa, cuscuz e finalizei com um iogurte.
Acordei, estava sol e eu era um homem novo. Besuntei-me de protetor solar, coloquei os óculos e mantive a fé neste país que nunca desilude. Se há estradas pelo campo, elas estão na Escócia. Os condutores seguem pela A9 e é praticamente nulo o tráfego por estas artérias. Vejo inclusive grupos montados a cavalo a percorrer pequenas ruas que vou cruzando. Penso “This is Scothland”.



Sair de Perth é fácil, basta seguir as placas que indicam o nº 775 da National Cycle Network. A sinalização para as bicicletas é uma preocupação constante, é por estas que me guio na enorme confusão criada pelas obras de uma nova ponte que cruza a grande massa de água que vejo no gps. É para a famosa Fourth Bridge Road que dirijo a bicicleta.
Faz sentido fazer esta ligação até Edi, atravessar um braço de água maior que o rio Tejo por uma ponte igual à nossa? Faz. Na maioria das vezes, só sabemos se valeu  mesmo a pena, se formos lá. É a minha opinião. É longo o tempo que levo a percorrê-la. Observo cuidadosamente a ponte do caminho de ferro (é Património da Humanidade e figura nas notas da Escócia), e do lado direito a nova ponte a ser construída. A ponte abana, as fotos saem desfocadas e o equilíbrio na bicicleta ganha uma nova dimensão.



É fenomenal a diversidade e abrangência do cenário que consigo abarcar à medida que a viajem vai chegando ao fim. Persigo a placa route nº1 e a indicação para o CityCentre. A única forma de poder haver engano é estar distraído com tudo o que me rodeia. Chegar assim, a qualquer cidade é sempre especial. Ui!!! Há turistas em todo o lado. Magotes de gente à espera do sinal verde, outros magotes de gente espraiados na relva a aproveitar o sol e mais magotes de gente a rolar em bicicleta sem falar nos magotes de gente nos autocarros e a sair da estação de Waverley.



Quero voltar para a ilha!!! Mas na ilha já eu estou. Então eu quero voltar para as highlands, ou, não sendo possível, quero o melhor sítio do mundo para viver. Portugal, mesmo cheio de portugueses (há vários episódios curiosos que que merecem a diferença de cultura. Refiro 2: não me deixaram ficar a dever 1pence. Onde quer que nos cruzemos com um carro, mesmo a longa distância, ele cede-nos passagem).



A roda da frente que transporta um raio partido há vários dias, depois de todo o massacre do piso duro de terra e demasiada lama, começa a ficar empenada.
O trajeto de Inverness para Edinburg foi desenhado no site da Sunstrans (site inglês com muita informação ciclística), onde, diante das várias opções disponíveis, escolhi uma rota equilibrada ente rapidez e beleza. Serviu na perfeição, mesmo no Cairngorm Park, o rumo traçado ajudou a tomar grandes decisões naqueles momentos em que para onde quer que olhemos, só existe paisagem. Relembro que tinha pouca resolução de pontos, no entanto, complementado com os sinais que surgem  em qualquer lado, torna-se uma ferramenta muito útil para quem quer explorar o ”lado de fora da Escócia”.






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