Roma, like a Pilgrim
– Ride, Pray, Love
Sou mais do que viajante ou ciclista, sou peregrino a percorrer a essência…
Há
mais de 13 anos que percorro, de bicicleta, diversas rotas de peregrinação até
Santiago. A última, em 2010, saí de Paris pela Via Turonensis para terminar no
túmulo do Apóstolo. Este ano, sigo para Fátima.
Está
longe o local onde ouvi pela primeira vez que o Caminho de Santiago deve
começar em casa de cada um de nós. Não contemplo a Catedral da janela do meu
prédio, não vejo a sinalização na berma da estrada mas a cada novo dia nasce
dentro de mim uma voz que diz: vem cá mais vezes, nunca andarás sozinho.
Para
ligar Itália, França ou qualquer outro país a caminho de Compostela, Fátima ou
a nossa casa, há várias possibilidades. Sigo um destino, um caminho com
diferentes direcções que assenta essencialmente em importantes caminhos
medievais de peregrinação.
Parto
da Praça de S.Pedro sobre a Via Francigena (rota de Jerusalém), em Sarzana desviei
desta via para continuar pela costa da Ligúria (via de La Costa) passando por
Génova.
A
Via Turonensis foi um importante caminho medieval de peregrinação a Roma e
Jerusalém. Parto da Praça de S.Pedro e só me desviarei desta via em Sarzana.
Nesta cidade continuarei pela costa da Ligúria (via de La Costa) passando por
Génova.
Viajar
não é opção de ricos. É preciso saber escolher o território onde queremos
pedalar. Itália, França, Espanha, bem como outras cidades dentro da Europa
comparativamente a outros destinos em outros continentes, têm um custo de vida
associado muito mais elevado. Roma tem este handicap facilmente vencido com
aquilo que já escrevi no passado. “ Os sonhos não devem ficar presos à
carteira”.
Saí
de Itália por Ventimiglia e foi em França que abracei as grandes rotas GR 653 A
- Via Aurélia e GR 655- Via Tolosana que confluem com o caminho Aragonês e
Francês e me transportam até ao Santuário de Fátima.
É
em modo peregrino que pedalo, mantendo a mente aberta e elevando as mãos aos
céus para que, mais uma vez, seja feita a minha e a Vossa vontade.
Esta
é - mais - uma aventura,seria um sacrilégio deixa-la escapar.
·
A
solidariedade
As
pessoas são a essência de qualquer caminho, de qualquer cidade e também do
conceito Refood.
É
como voluntário do Refood que pedalo no meu bairro em Alfragide para recolher
as sobras alimentares dos estabelecimentos de restauração e com estas evitar a
fome de quem mais precisa.
Todo
aquele que tem fome, pede comida porque está a precisar. Ser voluntário é, algo
que preciso fazer. O Refood serve de ligação entre estas 2 necessidades e a
minha vontade de espalhar esta ideia e valores por todos os bairros do planeta,
surge como um processo de descoberta e renovaçao de meu envolvimento com a
comunidade.
Temos
em nós, o poder e o dever de mudar o mundo de quem nos rodeia. Eu comecei pelo
meu bairro.
·
A
viagem
31Ago14
– Cidade do Vaticano -Vigna di Valle-Lago di Bracciano-Viterbo
Estive
5 dias a visitar Roma como turista. A prioridade de hoje era sair da cidade do
Vaticano cedo para evitar as multidões, os condutores italianos e o sol
inclemente.
São
inexistentes as indicações da via Francigena (VF) desde a praça de S.Pedro e
mesmo durante longa parte do percurso. Excepcionalmente um autocolante com as
cores de vermelho/branco aparece colado a um sinal de trânsito. É com a ajuda
do gps que navego, os poucos peregrinos que encontro vão para Roma.
Os
horizontes conseguem cativar a minha atenção, não pode ser a 100% porque ela
tem de ser dividida com veículos “quase sem condutor”. A minha segurança vem
essencialmente dos caminhos secundários com pouco tráfego, da muita fé e o
dobro da audácia.
Um
dia inteiro tem mais de 8h de pedalada e por isso dá para muita coisa. Encosto
junto ao lago di Bracciano. A amostra de areia é uma linha fina e longa, a sua
cor é negra e sobre ela pouco espaço sobra entre a toalha e a água.Deixo de
olhar o lago e mergulho com prazer, naquele momento esqueço que ainda tenho
mais de metade do percurso para percorrer.
Até
há pouco tempo não conhecia Viterbo. Quando planeio uma grande viagem por
etapas, a “prioridade” vai sempre para ficar alojado numa cidade com grande
interesse cultural/histórico. Não precisa ser grande, aliás, a hospitalidade
por vezes é inversamente proporcional à sua densidade populacional. Viterbo tem
base
etrusca, o seu núcleo urbano cheio de vida e história nem parece estar dentro de muralhas. Fico a conhecer o local onde está sepultado o único Papa de Portugal (João XXI), se não sei avaliar mais de cada pedaço das gigantes pedras que observo, é simplesmente porque a história e o conhecimento que me foi transmitido na escola, é diferente do que eu hoje vejo.
etrusca, o seu núcleo urbano cheio de vida e história nem parece estar dentro de muralhas. Fico a conhecer o local onde está sepultado o único Papa de Portugal (João XXI), se não sei avaliar mais de cada pedaço das gigantes pedras que observo, é simplesmente porque a história e o conhecimento que me foi transmitido na escola, é diferente do que eu hoje vejo.
01Set14
– Viterbo – Orvieto - Acquapendente
Depois
das 8h da manhã já não era permitido estar na Torreta Pio VI. O céu carregado
não tardou em despejar água, parecia que caía de baldes enquanto o vento lhe
dava direcção.
Tive
de fazer novos ajustes na viagem, não podia desviar da VF e ir a Orvieto.
Jamais abençoaria aquele local. Tinha mesmo de partir, nisto, a vontade nem
sempre tem autoridade sobre o que tem de ser. Seguia para sul fugindo dos
enormes lençóis de água que se iam formando na estrada.Cheguei seco, só vento
ficou.Na memória, a recordação de um dia de anos purificado.
Carrego 40 anos de idade, hoje, tenho o privilégio
de somar mais um. Peguei em 25 kg da minha vida, coloquei-os sobre a bicicleta
e aqui estou eu a seguir a visão que me entusiasma, motiva e
inspira para passar a ser a realidade que eu reclamo para cada dia, semana ou
mês de cada ano.
Passa
do meio-dia, sento-me numa das muitas praças que todos estes lugares têm e
questiono-me.
-Vale
Orvieto o esforço de mais 50km sabendo a posição fortificada onde se encontra e
o ambiente que pode ficar como o do amanhecer?
Vacilo.Hesito.
Como o resto do Tiramisú para ganhar serotonina.
Regresso
ao passado e à da leitura do livro “Um lugar dentro de nós”, e eis que surge,
nunca por acaso, uma referência à via francigena e a alguns locais imperdíveis
nesta rota. Em conversa com o autor do livro, Gonçalo Cadilhe, o maior viajante
português da actualidade, é-me indicado que Orvieto e Pienza serão os lugares
mais empolgantes da viagem.
O
esboço para este périplo há muito que estava planeado mas o trajecto definitivo
sofreu muitas alterações e existem várias versões do mesmo. A VF já tem
séculos, mas, cada vez que olho para o mapa, não há cidade que não esteja
carregada de história e sobre a qual se torna difícil a decisão de prescindir
da visita que está distante da linha traçada. Era o caso de Orvieto, de
Florença e Pisa, cidades que não podia deixar de visitar.
Está
lá longe, bem no cimo do monte, já a vejo. Orvieto deixa-me impressionado. A
frase era clara, “nada consegue preparar-nos para o dislumbre visual da
Catedral Gótica de Orvieto”. Julgo que o guia “lonely planet” ensinou bem a
lição, sentia-me preparado. Num instante, no espaço permitido pela esquina de 2
edifícios, um alçado colossal de cores douradas. Senti o mesmo impacto quando
estava em Petra e vi o Monastery por uma fenda da montanha.
A
construção desta Catedral demorou 30 anos a planear e 3 séculos para ficar
concluída. O perfeito, o belo, a dedicação e arte humana estão ali em cada
milímetro.
02
Set- Acquapendente-S.Quirico-Monteroni D´Árbia
Entro
na Toscânia pela porta grande. Se existe algo que me irrita quando viajo em 2
rodas, é o vento. Julga-se anfitrião de qualquer região e vem sempre ter com o
ciclista.
Não sei descrever os campos de alfazema, as cores e os contornos que olho no postal que compro. Só consigo dizer que a primavera só deixou a cor castanha, os ciprestes e as casas, nada se perdeu, a beleza existe e não preciso de um pedaço de papel para o confirmar. Estou a girar pela Tuscânia, pedalando por uma terra multicolor incrivelmente linda. As paisagens de San Quirico são conhecidas pelo mundo como um exemplo da beleza da terra toscana. “L´Original è qui”- dizem os residentes.
Não sei descrever os campos de alfazema, as cores e os contornos que olho no postal que compro. Só consigo dizer que a primavera só deixou a cor castanha, os ciprestes e as casas, nada se perdeu, a beleza existe e não preciso de um pedaço de papel para o confirmar. Estou a girar pela Tuscânia, pedalando por uma terra multicolor incrivelmente linda. As paisagens de San Quirico são conhecidas pelo mundo como um exemplo da beleza da terra toscana. “L´Original è qui”- dizem os residentes.
Faz
tempo que o cansaço físico habita em mim e sei que não vai desaparecer. Tenho
aqui imensas distrações que me ajudam a não ficar preocupado com isso.
Parei
em Ponte D ´Arbia, repouso num edifício simples mas bem equipado para receber
peregrinos. Já somos 4, com o tempo junta-se uma idosa francesa que está a
andar à 2000 kms( quando for velho quero ser assim).
Partilho
o fim de tarde, o café e um doce com um alemão reformado de 61 anos (também já
tinha 2000kms nas pernas e falava 5 linguas). É com ele que decidimos delegar o
que cada um deve comprar para o jantar comunitário. Nas muitas conversas,
dizia-lhe eu, a confiança é mais importante que o controlo.
Com
1kg de pasta al dente apurada com o paladar que aprendi nestes dias em Itália,
juntamente com umas garrafas de vinho e temos mais um momento simples que torna
este tipo de viagem inesquecíveis. A essência são sempre as pessoas, onde quer
que estejamos.
03Set - Ponte D´Arbia – Siena- San Gimignano
Nesta
região tinha planeado um punhado de quilómetros para um dos dias. Não chegavam
aos 30, coisa pouca para quem se desloca em bicicleta e especialmente para mim
que tinha de andar 3000 kms durante um mês de férias. Ia para Siena com os
olhos abertos tal e qual 2 ovos fritos, a parte do troço da VF coincidente com
a estrada nacional era aflitivo e só os desvios pelo percurso cicloturístico
L´Eroica me devolvem o oxigénio.
Cheguei,
estou ombro a ombro com a imponente Torre Del Mangia na piazza del Campo (há
quem a considere a praça mais bonita de Itália). Deambulo pela história desta
cidade que parece embalar dentro dos muros antigos, a sua arquitetura medieval,
as ruas e os magestosos monumentos são um museu ao ar-livre, para mim, dispensa
bem a aventura de ficar horas na fila para os visitar. Magotes de turistas,
como rebanhos, seguem o guia indiferentes ao movimento que os rodeia. A
campainha afasta-os, mas são “mille”, “mille”, cada um na sua direção e na
maioria das vezes fico sem espaço para seguir caminho.
Continuo a atravessar o coração da Toscânia, os campos enchem-se de oliveiras e vinhas . É por estes caminhos cénicos que vejo muitos grupos de bicicleta.No horizonte reconheço a silhueta de mais uma vila fortificada. Pela dimensão deduzo que seja Florença, ao olhar para o gps percebo que esta cidade está demasiado longe, que está afastada da VF e provavelmente não será hoje que a contemplo.
San
Gimignano está cravada de torres medievais, há milhares de anos que é próspera
devido à sua localização nesta rota. É sem dúvidas a “Manhatmam medieval”. Esta
conotação não é segredo, existe um grande fluxo de turistas e apresenta-se
muito comercial.Entrei numa das portas das muralhas e só no final percebi que o
Convento S. Agostino que eu procurava se situava à direita da porta S.Mateus no
outro extremo da vila. É horrível fazer gincanas ou razias às pessoas carregado
de alforges. Preferia percorrer o nosso bairro alto sábado à noite.
Tenho a chave do Convento só para mim. Sou o rei da minha cela
Tenho a chave do Convento só para mim. Sou o rei da minha cela
04Set - San Gimignano-Linati- Barberino Val D Élsa-
Romita-Bargino- Florença
Vão
surgindo pequenos recantos, todos eles muito silenciosos e de cotas elevadas
onde posso contemplar todo o Val D´Elsa e as encostas cobertas de uva usada
para o famoso vinho Chianti.
Olho
para trás e recordo o momento tranquilo em Linati quando enchi e pousei o bidon
de água (oferecido por um elemento da equipa Lampre no Tour France),junto da
Abadia que tornava aquele local sagrado. Era íngreme demais chegar lá
novamente, a água não compensava o esforço, seria inapropriado tirar algo que
decidiu ficar. Ficou, marcou a minha presença.
Há
muitas indicações para Firenze, quase sempre por via rápida, ou estradas
nacionais. Perdi de vista a sinalética vermelha/branca e sigo paralelo ao rio e
auto-estrada, não devo estar muito errado.
Hoje
sei a dimensão e quanto pormenor tem a Catedral de Santa Maria del Fiore, não
tive dúvidas quando a reconheci no horizonte. A sua cúpula é visitável, quem
sabe as pessoas que lá se encontravam me ouviam a gritar a quilómetros de
distância?!!
5set
- Rest day para visitar Pisa/Florença
O esboço para este périplo há muito que está planeado mas o trajecto definitivo tem sofrido alterações e existem várias versões do mesmo. A Via Francigena já tem séculos, mas, cada vez que olho para o mapa, não há cidade que não esteja carregada de história e sobre a qual se torna difícil a decisão de prescindir da visita que está distante da linha traçada. Afastadas deste Caminho de Santiago estão as cidades de Florença, Pisa, Veneza, Nápoles, Milão. “Só” farei o desvio para Florença, Pisa, Veneza (não resisti), de outra forma arriscaria a deambular por Itália e acabava a ficar todo o mês por aqui. Tenho a certeza que não faltariam surpresas, momentos e monumentos que me fizessem feliz.
É assim que chego a Pisa, sempre ao
longo do rio Arno comboioooooo. Para um distraído que não visse para lá das margens do rio, diria que estava em Florença, ainda que
distassem 80 km desta.
As
cores castanhas, as igrejas românicas e góticas, as piazzas, as esplanadas para
ao rio, os palácios renascentistas continuam a ser protegidos pelas enormes
muralhas e torres medievais.
No
seu casco antigo, junto da Porta Nuova, surge a piazza dei Miracoli com o seu
mais famoso ícone. A torre inclinada de Pisa. Apaixona-me a harmonia dos arcos
“gracefull” que criam um estilo contínuo, visualmente muito agradável
6Set
- Florença-Bassa-San. Miniato-Fuccheccio-Lucca-Avenza
Hoje
era sobre a estrada ou sobre o rio. As estradas de alcatrão deste país também
têm raízes debaixo da superfície, não me agarram. Apanhei boleia de uma esquadra
italiana, colei-me a 2 bicicicletas de roda fina. Eram ciclistas em fuga, em
pouco tempo era varrido pelo pelotão que não sendo tantos como o TGV da margem
sul, mesmo assim perceberam que podem utilizar a bicicleta para o refood e que
me ajudaram a chegar mais perto de França.
S.Miniato
e S.Miniato Basso, percebo agora que os nomes servem para diferenciar estas
povoações, a mais conhecida (fortaleza) está bem aninhada no topo da colina. É
pequena, no entanto representa uma rica secção da toscana. É um encontro
perfeito entre o desenvolvimento moderno com as vilas tradicionais.
Cada
vez que tenho de chegar bem alto percebo que o casamento da cassete com a
corrente não é pacífico. Elas “passam-se” quando me coloco de pé a pedalar e
gritam que é muito peso. Percebi esta situação nos dias mais difíceis, as
chamadas lojas oficiais que encontrava eram apenas para reparar bicicletas
citadinas muito antigas. Este era o seu mercado e para ele estavam preparados.
Quando
surge algo em titânio, alto, que esta é de outro país. Só hoje foi possível
trocar a cassete, mesmo assim foi necessário pedir se podiam desmontar a
bicicleta em exposição. Sem mecânico na loja, mostrei do que precisava para
começar a trabalhar, e ganhei 2 barras típicas da toscana e umas belas fotos
com mais um casal que adorou a ideia do refood.
Com
o tempo dispendido no upgrade da bicicleta, necessitava seguir caminho o mais
rapidamente possível. Atravessei Lucca pelo seu Centro Histórico, cruzei as
suas portas e passei sobre os seus fossos que antecedem as poderosas muralhas.
Foi tudo muito rápido, receava os Alpes Alpeninos antes de descer para o
Mediterrâneo e poder ver a Riviera Italiana. Tudo passa, a longa avenida de
praias e complexos turísticos era completamente plana e extremamente vasta
possibilitando ultrapassar a centena de quilómetros para este dia. Cheguei
esgotado ao albergue S.Piedro em Avenza.
7Set-
Avenza- La Spezzia-Cinque Terre – Levanto
Tudo
azul pelo mar da Ligúria até La Spezzia onde montanhas caem a pique sobre o
mar. O litoral daqui para a frente é de tirar o fôlego, é recortado, um
verdadeiro pedaço acidentado de terra com encostas atapetadas de azeitonas e
videiras de vistas memoráveis e promontórios salientes. Chama-se Cinque Terre
(Monterosso, Vernazza, Cornigha, Manarola e Riomamaggiore. Unesco) e estende-se
desde o porto de La Spezia até à praia do Levanto para onde vou.
Estou junto aos barcos a olhar as povoações que se elevam bem acima de mim. Carrego no pão com nutella, quando o suor escorre pela face e chega à boca, pretendo continuar a sentir o sabor a chocolate.
Estou junto aos barcos a olhar as povoações que se elevam bem acima de mim. Carrego no pão com nutella, quando o suor escorre pela face e chega à boca, pretendo continuar a sentir o sabor a chocolate.
Que
bom foi pedalar pela VF até Sarzana. Cidades históricas carregadas de
monumentos proporciona-me uma riqueza histórica e cultural incrível.
08Set
Levanto-Bonasola-Framura_Devi-Marina-Sestri-Levante-Génova
Impressionante!!!
Quilómetros de ciclovias dentro de túneis que aproximam as povoações de
Levanto. Não distam mais de 7 km entre si mas as montanhas que as separam são
uma que as deixam sozinhas, isoladas junto ao mar.
Centenas
de bicicletas estão presas numa das grades que separam da linha do comboio. No
fim da linha, apanho um elevador que me deixa ao nível do mar entre um
emaranhado de embarcações. Fico confuso e desorientado por um instante, estou
num porto de pesca e não há indicações de saída.
Pergunto
a um pescador que me diz algo como “a montanha é por ali e é muito difícil”.
A
linha do track leva-me para direções opostas às placas que dizem Genoa. Olho o
gps e confio, ele leva-me para junto da costa.
Estou
prostrado em frente a um túnel em Devi Marina que proíbe toda a circulação
excepto carros. Fiquei siderado, é a 2 vez que acontece algo semelhante. Em
2011, na Islândia, o túnel era sob o mar, o desvio custou mais de 60 km num dia
horrível de chuva.
O
gps hoje dava-me a solução, voltava atrás e percorria toda a linha de montanhas
para poder contornar este obstáculo. A minha vontade não era essa, liguei toda
a iluminação que transporto comigo e preparei-me para o proibido.
O
túnel só tem uma faixa de rodagem e serve para os 2 sentidos. O sinal vermelho
dura 10 min., é o tempo de ser abordado por uma motocicleta que alerta para o
perigo que vou enfrentar e que tem havido mortes por falta de respeito ao
sinal. Acendem-se agora as luzes do meu cérebro. Não vou colocar e minha vida
nas mãos de um condutor que não tem culpa da minha irresponsabilidade.
Apita
o comboio! Entro na estação e apanho o comboio que me salva até Sestri Levante.
Toda a Itália é bem servida de linhas de comboio, viaja-se mais depressa, mas
não é a mesma coisa.
Continuo
o sobre/desce constante característico desta costa da qual avisto praias
fabulosas. Um dia não chega para estender a toalha em todas elas.
Génova
é conhecida como La Superba, o seu porto comercial é o mais importante de
Itália. A cidade fascina pela sua dimensão, pelos contrastes das estâncias
balneares e ruas estreitas da cidade antiga.Olhando as curvas de nível e a
forma como está projetado o traçado urbanístico, tem tanto de grandiosidade
como tem de incoerente e de sinuosa. Foi em Génova que senti não haver espaço
para pedalar.
9Set
Genova- Ceriale
Ás
07h00 da manhã, hora que saio do YH e já o comércio tem as portas abertas e o trânsito de carros
e pessoas não ajuda para sair da cidade. As longas avenidas, os constantes
semáforos são parte desta cosmopolita urbe.
Estas
cidades costeiras parecem decalcadas a papel químico, começo a ter uma sensação
de deja vu à medida que vão surgindo, percorro as suas ciclovias (algumas
dentro de túneis), áreas pedonais e hoje as praias estão desertas. O sol ainda
não apareceu.
Passa
do meio-dia, chego ao fim do mar da Ligúria (Varigotti) e a temperatura já
convida ao mergulho. Ter de pagar está fora de questão, circulo um pouco mais e
a água tem a mesma cor límpida, está quente e ainda bem que a praia é de
cascalho. Um luxo para peregrino.
Existe
muita oferta hoteleira mas nada se descobre a preço de peregrino. Acampo em
parques de campismo onde a estadia pode chegar ao 24€ ou procuro uma porção de
terra para colocar a tenda.
O traçado é plano permite avançar mais depressa para a fronteira de Italia.Opto por ficar no parque de campismo a meio da tarde, sei que o céu está cinzento, que o vento levantou e daqui a poucas horas, nada mais ficará..
O traçado é plano permite avançar mais depressa para a fronteira de Italia.Opto por ficar no parque de campismo a meio da tarde, sei que o céu está cinzento, que o vento levantou e daqui a poucas horas, nada mais ficará..
10Set Ceriale-San Remo-Ventimiglia-Menton-Laghet
Levantar
acampamento demora sempre mais que a rotina diária de colocar alforges e partir
para a etapa seguinte. Continuo a não resistir à água e ás centenas de
esplanadas na Riviera Italiana. Imagino que não tenho data para chegar a
Portugal e deixo-me encantar por este cheiro a férias.
Já
não é agosto e San Remo continua tão turístico como as expectativas que trazia.
São labirintos de lojas, independentemente da direção escolhida. A ciclovia é
obviamente a escolha certa para atravessar esta cidade. Perdi a conta aos
quilómetros de túnel, não era escuro como os demaois, havia placards com néons
azuis suspensos em tectos abobadados e que ao longe pareciam uma nave espacial.
Eram as faixas de rodagem pintadas a cor de rosa que davam o toque artístico
final.
França
está perto, um terço do meu propósito já foi alcançado. A acolhida hoje na rua
do Louvre em Menton parece que está repleta de idosos. É natural, isto é um
lar… Uma troca de palavras e aceito fazer mais 15kms em montanha até Langhet.
O
caminho é agora referenciado pelas marcas do Grand Randonneur que deixa a costa
para se alojar na protecção que os colossais maciços dos Alpes Marítimos
oferecem. Longe do vício, a monotonia, aqui, não se aplica, vejo da urbanização
terraços do Mónaco, uma vista única sobre a cidade. Sou surpreendido pelo
Santuário Notre Dame de Laghet, milhares de placas, fotos e objetos estão
pendurados nas suas paredes para agradecer um milagre. Procuro algo relacionado
com bicicletas, vejo muletas. Muitas mesmo…
11Set
Laghet-Nice-Cannes-Fréjus
Larguei o sossego do lugar e em pouco tempo chego a Nice. O tráfego é intenso, felizmente esta cidade apostou em ciclovias que nos transportam rapidamente e em segurança para bem longe de um ambiente que não é o das duas rodas.
Segue-se
Cannes e mais localidades sobejamente conhecidas, definitivamente esta parte
não pertence à peregrinação. Está sol, tudo ali convida ao dolce fare niente.
Faltam poucos quilómetros para retornar à GR e ao objectivo de seguir as vilas
históricas que acolheram os peregrinos há vários séculos atrás.
Fréjus
tem um belo centro histórico, tem Catedral mas não existe albergue, resta-me
procurar um parque de campismo. Extremamente caro para colocar apenas uma tenda
e tomar um banho. Com a música ao vivo a durar pela noite dentro, este lugar
não estava planeado no meu mapa. Quando preciso tomar uma decisão ela
sabiamente aparece, amanhã sigo novamente para os Alpes, prefiro ser peregrino
em detrimento de turista.
Não
me recordo se nasci peregrino, atualmente, depois de já ter pedalado milhares
de quilómetros pelos vários caminhos de Santiago, reconheci algo. É aqui que
melhor oiço a minha alma.
Quando
viajo desta forma, a ouvir uma língua que não me é familiar, a depender do meu
esforço para chegar a algum lado e da maioria das vezes não saber onde comer ou
dormir, percebo que o que julgava ter aprendido no passado, é insuficiente
perante estes desafios.
É
assim, perante o inesperado que surge um novo eu aberto às experiências.
Recordo
o massif L´estérel, um lugar montanhoso
com pouca terra vegetal e uma cor castanha muito intensa. É normal haver muitos
aventureiros e turistas para a apreciar,foi onde também descansei e tomei o
reforço alimentar do meio-dia.
12Set Frejus –Lorgues-Saint Maximim la Saint Baume
Há
vilas que são incontornáveis nesta GR, ponto final. Regresso às origens, às
esplanadas nos pequenos passeios cobertos de árvores que lhes dão sombra e
ambiente, à tranquilidade de um caminho que deve ser desfrutado.
Pedalo
a metade da velocidade, calcorreio a pé alguns do troços mais difíceis cobertos
de pedra que estão bem marcados com a sinalética da GR-653 A (Via Aurélia). No
meu horizonte, Alpes, nas minhas costas ficaram os Alpes marítimos, por agora
pedalo por um território fértil, a Provence Vert.
Foi
tranquila a noite passada na tenda colocada algures nesta rota bem como a
refeição e os mimos que comprei para me acalentarem a falta de conforto de um
banho e de um local mais abrigado.
Quando
estudava este itinerário e planeava as etapas não esperava que tão perto dos
gigantes dos Alpes pudesse haver zonas tão planas que permitissem juntar 2
etapas numa só. Os pneus marathon plus quando rolam no alcatrão deslizam
maravilhosamente.
Hoje
o percurso por Aix-en-Provence e Salon-de-Provence foi duramente monótono e
aborrecido. Tirei a mochila das costas , coloquei-a sobre os alforges, baixei a
cabeça e comecei um autêntico contra-relógio para chegar a Arles já bem ao
final da tarde.Nesta hora o cansaço já domina mais de metade do corpo, é com o
gps que chego sem pensar e sem precisar de estar atento aos sinais à morada de
acolhimento.É uma casa particular. Sou recebido por um senhor de 80 anos que me
pergunta quem me mandou para ali? Não telefonei, não fazia ideia do que iria encontrar,
simplesmente apareci.Estava ali e era peregrino. Mostrei o meu planeamento
rasurado, rasgado, gasto pelo uso de muitos dias visto várias vezes ao dia.
Tudo
conspira a nosso favor quando a intenção é boa. Fiquei para dormir e jantar,
fiz companhia a este simpático casal que gosta de receber e de um ciclista
italiano que tinha reservado alojamento.
14Set
Arles – Montpellier
Arles
é um dos 4 grandes pontos de entrada dos Caminhos vindos de frança. Há quem lhe
chame “litle Rome”, é um eixo fulcral na ligação entre os vários caminhos e por
aqui passam pessoas de todas as nacionalidades.
Na
casa da família Debard recebi tudo o que precisava para me sentir um homem
novo. Recuperei toda a energia, sentia-me como se tivesse começado a pedalar
apenas hoje contrariando os 1200 km que já levo acumulados.Depois de muita
conversa entre refeições, a atenção da dona da casa foi ainda mais longe quando
recusou parte da minha contribuição monetária e me presenteou com o almoço para
o caminho. É em situações como estas que ficamos desarmados pois o dinheiro não
compra aquilo que nos é dado com o coração. Pego nos logos refood, escrevo uma
dedicatória e ofereço como sinal de gratidão. Mais tarde, em Portugal, acabo
sempre por enviar para estes “bike angels” (como chamo a quem me ajuda), uma
lembrança para que sorriam uma vez mais.
Como
explicar a sensação de chegarmos a um sítio, sentirmos a energia, a quietude e
a paz daquele lugar? Nunca tinha ouvido falar de Saint Gilles, no entanto, uma
forte vontade levou-me à abadia que viria a descobrir ser do séc. XII. Por todo
o lado convites à pausa do peregrino e souvenirs a lembrar a peregrinação.
Carimbei a credencial nesta vila que é Património Mundial e é também o 4 local de peregrinação do mundo cristão após Jerusalém, Roma e Santiago.É maravilhoso ter o privilégio de conhecer todos eles e de agora pedalar em direção ao Santuário de Fátima que é português. Está longe mas é universal, também o é esta escrita e esta bicicleta, ainda que, role colada a uma terra que não é a sua.
Carimbei a credencial nesta vila que é Património Mundial e é também o 4 local de peregrinação do mundo cristão após Jerusalém, Roma e Santiago.É maravilhoso ter o privilégio de conhecer todos eles e de agora pedalar em direção ao Santuário de Fátima que é português. Está longe mas é universal, também o é esta escrita e esta bicicleta, ainda que, role colada a uma terra que não é a sua.
15Set
Montpellier – S.Guilerme Desert- St.Privat-Lodeve
Montpellier
merece toda a atenção que ontem não lhe consegui dar. Perco-me aqui por umas
horas, gosto de deambular nestes becos antigos, ver esplanadas, igrejas e o corrupio
das pessoas a dar cor à cidade. Daqui começo a Via Tolosana.
Nada
do que está ao meu alcance se assemelha às paisagens dos últimos 3 dias. Contemplo
caminhos de montanha, à sua volta não há eucaliptos, são milhares os hectares
de pinheiros que nunca ficam para trás pois parecem não acabar.
Lodeve
também é de base medieval, deixa-se ver bem à distância mas agora tenho a
gravidade para me ajudar.
16Set
Lodeve-Lunas- St. Gervais sur Mare-Salvetat Sur Agour
Começo
bem cedo ao nascer do dia pois sabia que hoje ia ser a etapa rainha da minha
viagem. Durante 5h poucas vezes toquei no selim, as subidas/descidas e
envolventes do Parque Natural do Haut-Languedoc tomavam conta do meu tempo.
Via
e sentia o nevoeiro, a pala do meu capacete parecia um estendal a pingar, perdi
uma oportunidade de ver bem do alto, o que ao perto me desperta tanto
entusiasmo.A minha preocupação era estar visível, os carros que se cruzam
comigo são poucos mas ainda assim representam uma verdadeira ameaça.
Rarifica-se
a presença humana por estes bosques, para mim, ainda que sozinho aqui a
pedalar, a minha bicicleta lembra-me que nunca estou só. Sou um ciclista que o
destino acrescentou a esta paisagem.
17Set Salvetat
Sur Agour – Anglés-Castres-Revel
Dormi
mal. Os relâmpagos iluminavam o quarto e o som da chuva e trovoada inquietavam
a noite. As previsões meteorológicas estavam corretas (alerta a partir das
00.00 com uma janela de tempo nublado entre as 08.00 e as 10h00.
A
distâncias entre aglomerados urbanos acentua-se, é cada vez mais natural o
isolamento a que sou sujeito. Entro em piloto automático por vezes e os olhos
fecham-se a pedir descanso.
Passei
Castres e sigo para Revel onde me encontro neste momento em mais uma
estratégica paragem no centro da vila para buscar uma ligação wi-fi e o posto
de turismo bem situado na praça quadrada do séc. XIV. Em seu redor, uma enorme
estrutura de madeira suporta o telhado, as arcadas e a próprias casa são
suportadas por vigas de madeira.
As
informações que transporto comigo relativamente aos alojamentos são um pouco
escassas, aqui sempre obtenho que necessito para aprimorar as etapas que
planeei há meses atrás.
18Set
Revel-Canal do Midi-Toulouse-Léguevin
Existem
muitos motivos para ficarmos instalados nos albergues de peregrinos, nestes
casos, com uma simples conversa no dia anterior fiquei a perceber que para
chegar a Toulouse era preferível seguir o Canal do Midi (mesmo estando
ligeiramente afastado do Caminho de Santiago).
Segui
e contornei, dezenas de quilómetros, uma margem de La Regol que ia desaguar ao
canal do Midi.Não sabia de onde soprava o vento, devia vir de longe pois ainda
chegava forte até mim. Tão forte que me ajudava a rolar a 40 km/h em algumas
partes do percurso. Abrandei, assim chegava demasiado cedo a Toulouse. Parei,
tirei fotos, apontamentos, apreciei estar naquele lugar, sabia que ia demorar
uma eternidade a este ritmo escolhido por mim.
Na
minha opinião, as distâncias não têm importância, respeito-as pela limitação
que podem provocar na observação do território que atravesso. Não as valorizo,
não são elas que ditam as fronteiras do que quero ou posso percorrer e por isso
foco-me no prazer e no simples gesto de fazer girar os pedais. A magia move-se,
torna vísivel e presente o que muitas vezes não se vê a quem se desloca doutro
modo.
O
canal do Midi capta toda a minha atenção, data de 1750, tem 63 eclusas neste
troço e uma história que não vale a pena contar.Para mim, não há forma mais
bonita, mais rápida, mais ecológica para chegar a Toulouse do que a bicicleta.Na
margem onde rolam os meus pneus o piso está alcatroado, são muitas as pessoas
que se deslocam como eu e outros tantos fazem-no a correr. A menos de 10 metros
– simétricos- estão plantados plátanos (42 000) que formam uma cúpula e fazem-me
lembrar a estação do Oriente em Lisboa. Estes são mais imponentes que as
estruturas metálicas de Calatrava e prolongam-se numa distância que nem vale a
pena contar.
Há barcos (cada vez mais e maiores), atracados ao longo do curso de água, talvez um dia regressem ao Mediterrâneo, por agora, são belas esplanadas e à noite transformam-se em alojamento.
Há barcos (cada vez mais e maiores), atracados ao longo do curso de água, talvez um dia regressem ao Mediterrâneo, por agora, são belas esplanadas e à noite transformam-se em alojamento.
Toulouse,
que cidade viva. Sair daqui é exatamente o oposto do que contei e do que vi
noutras grandes cidades, foi difícil tomar a direção certa de Léguevin e antes
ainda apanhei um susto quando quase entrei numa
via rápida.
19Set Léguevin- Gimonte-Auch_Montesquiou
Novo
dia, novo fôlego, deixo-me estar deitado para lá do toque do despertador, simplesmente
não parece que estou a 1cm do solo. Aguardo que nasça o sol, ainda tenho muito
caminho a percorrer, preciso afrouxar o ritmo.
20Set Montesquiou-Marciac-Morlaas-Lescar
O
track seguia muito perto da estrada, havia momentos em que a contornava sem no
entanto trazer grandes benefícios que contribuíssem para uma bela foto. Era
mais curto mas não era mais rápido para uma bicicleta. Sem abastecer, avancei
estrada fora pois sabia da existência de diversas povoações.
A
silhueta dos pirenéus a barrar todo o horizonte, os quilómetros sucediam-se e
eu continuava a pedalar sem conseguir descobrir algo para comprar. É assim que
me sinto vivo quando pedalo pelo desconhecido sei que abri uma enorme porta
para o mundo e vi um espaço onde toda e qualquer coisa é possível.
21Set Lescar-Urdos
Começa
a não ser fácil encontrar palavras para descrever estas sensações, para
ilustrar os tons verdes e as construções típicas deste cantinho que me deixa
sempre saudades. Soam-me a familiares estas montanhas que me envolvem e ao
mesmo tempo me desafiam para estar alerta com todos os sentidos.
As
poucas marcas humanas desenrolam-se ao longo do vale que vai subindo até ao Col
du Somport. É pouco antes, na povoação de Urdos que procuro abrigo. São
frequentes as trovoadas e as grandes descargas de águas, principalmente ao
final da tarde. Com dinheiro mas sem comida para comprar, cozinhei maçãs bravas
depois de perceber que eram amargas e muito duras.
Já
troco palavras em espanhol, está perto o meu país, faltam 1000 kms, despachar
tenda/fogão e um amontoado de palavras escritas com alma…
22Set Urdos-Col Somport-Canfranc-Villanua-Jaca.-Arrés
Esforcei-me
para chegar cedo ao túnel do Somport. O sinal do gps mantinha-se sobre a
nacional e eu avancei, passo o controlo de segurança e continuo…A visibilidade
é imensa, tem boas bermas mas ainda assim opto por ir bem sinalizado pois sei que
são 8 kms dentro da montanha. A meio do percurso vejo quatro piscas e um sem
número de lâmpadas laranjas à minha frente, sou barrado pelo piquete de
serviço. Tenho de inverter a marcha para França, atrás de mim, como escolta,
seguem o carro dos piscas e outras máquinas à velocidade da minha bicicleta.
Volto
a ligar o gps (dentro do túnel não servia de nada), diminuo o zoom e vejo as
alternativas que sempre existiram e o track do caminho que devo seguir. Em
Somport, lá no topo está a fronteira espanhola e uma mão cheia de pequenas
habitações onde quase ia perder o prazer de as ver. Entro no refúgio Aqsa já em
território espanhol para um beber um café e aquecer antes de começar a descer. A bicicleta está
solidária comigo, eu tremo, ela treme…
Reconheço a cidade de Jaca, já aqui passei aquando da travessia dos pirenéus, sem saber que tipo de percurso tinha pela frente, decido avançar para Arrés onde encontro um hospital para peregrinos cuja tradição é oferecer alojamento e alimentação aos que aqui buscam abrigo.
Reconheço a cidade de Jaca, já aqui passei aquando da travessia dos pirenéus, sem saber que tipo de percurso tinha pela frente, decido avançar para Arrés onde encontro um hospital para peregrinos cuja tradição é oferecer alojamento e alimentação aos que aqui buscam abrigo.
Falta
muito para chegar ao caminho francês mas nota-se já o fluxo de peregrinos.
Nesta zona de Navarra são mais os estrangeiros que os habitantes das aldeias. É
um caminho duro que em nada se pode comparar ao que encontramos depois de
Puente de La Reina (segundo li, esta vila não tem mais de 30 habitantes).
Arrés
amanhece no cimo do monte, solitário, sem rasto de pássaros, cães e gatos e
também algum vazio de peregrinos que buscam outras paragens. Este local convida
a saborear o silêncio. Puro, belo, limpo, tranquilo.
A
neblina enche toda a paisagem, ela acaricia, humedece a terra já de si empapada
pela chuva de ontem. É uma etapa plana até Sanguesa, a distância entre
povoações era enorme e eu julgava ser esta a única dificuldade. Puro engano.
Consigo ver claro agora que subi um pouco mais e a neblina levantou. No horizonte, os pirenéus já não representam ameaça, mais abaixo, a barragem de yesa. Desço e continuo a descer até ler numa placa de sinalização que a estrada está cortada a 4 kms. Todas as localidades para onde queria ir apareciam noutra placa em direcção à via rápida.
Consigo ver claro agora que subi um pouco mais e a neblina levantou. No horizonte, os pirenéus já não representam ameaça, mais abaixo, a barragem de yesa. Desço e continuo a descer até ler numa placa de sinalização que a estrada está cortada a 4 kms. Todas as localidades para onde queria ir apareciam noutra placa em direcção à via rápida.
Já
aprendi que onde houver muita água, qualquer indicação que surja, não é bom
sinal. Olhei para a cartografia do gps e avancei com fé. Uma derrocada tinha
desfeito a estrada e esta estava em obras, olhei em redor e vi o denso bosque,
o gps mostravava-me um caminho isolado e colado à encosta da montanha. Ali esta
estava o local ideal para o Monastério de Leire. O caminho - afinal era o único
acesso - para mim era a fuga para uma nova liberdade.
Tive
um encontro improvável! com uma seta amarela. Segui na sua direção e fui sendo
conduzido bosque adentro até conhecer a fuente de Las Virgens e o emblemático
Monastério so Séc. IX. Estava longe de imaginar a via sacra que foi o dia de
hoje. Carreguei, e bem, a minha cruz.
O
Caminho Navarro desde Sanguesa estava a ser “duro de roer”, o azul do céu
compunha metade da paisagem que me expunha ao vento que corria livremente por
estes longos vales ondulantes.
24Set Monreal-Puente La Reina-Torres del Rio-Viana
Prefiro
a névoa ao frio da manhã. Sentia-me um cabide carregado de roupa pela estrada
que hoje era plana e calma.
Finalmente
livrei-me dos 4kg de tenda e acessórios e despachei tudo em Puente La Reina. O
serviço dos correios é muito dispendioso, noto a diferença de peso, ainda assim
questiono-me se não valia mais ter entregado tudo aos escuteiros. O conteúdo da
caixa verde não vale com certeza o valor do envio.
Confesso
que imaginava o caminho tão descaracterizado como o estou a viver neste
momento. Este é um caminho vivo porque é feito de pessoas, no entanto, quanto
mais somos, menos unidos parecemos. Cria-se distâncias, frieza e muitas vezes
as mesmas atitudes que se têm no dia-a-dia. Afinal, para quê fazer o Caminho de
Santiago? Um encontro pessoal? Sim, mas essencialmente uma dádiva do que temos
de melhor aos outros, uma palavra e um sorriso.
Foi
com este espírito que voltei a entrar na Casa EL Chozo quando bem do alto se
avista Logroño. É a cass da D.Felissa, há 11 anos estive aqui porque esta
senhora nos dava “higos, Agua Amor”, não é preciso uma estampa na credencial
para o confirmar. A dona da casa partiu, no seu lugar, a filha Maria de 81anos
continua o seu legado.
Os
tempos são outros, a mesa está cheia de alimentos e bebidas quentes para
acalentar o peregrino, mas como dizia, os tempos são outros, as pessoas já não
param e não sabem que estas pessoas são genuínas e são as originais. A D.Maria
dizia “o Caminho já não é o mesmo, há muita gente mas vêm sem mochilas, em
autocarros e correm à procura de cama.
Existe
outra personagem mítica nos jardins de Logroño. Todo vestido à peregrino, de
barbas longas e grisalhas, convida-nos a fazer uma pausa para nos oferecer
algumas bolachas e mais um selo. Hoje já não está por cá. Quem sabe se também
já partiu?
Estou
para lá de Navarrete, sinto necessidade de escrever e comer e é numa grande
área de descanso com mesas de madeira (em ventosa) que paro o tempo. Reencontro
pela 3ª vez um ciclista que conheci há 5 dias atrás, é tempo de Ultreia. Hoje
sou eu que ofereço bolachas enquanto ele partilha comigo que em Grañon temos um
albergue paroquial de espirito comunitário. É uma verdadeira relíquia e um
segredo que não vem nos manuais do Caminho.
26Set
Grañon- Belorado-Alges- Atapuerca - Cardeñuela Rio Pico
O frio e as extensas paisagens castanhas dominam a província de La Rioja. Os caminhos são fáceis e muito rolantes se não estiverem encharcados de água, as povoações que cruzam, algumas têm 10 ou menos habitantes (sei que existia uma com apenas 3 e eram todos os que habitavam o albergue).
Amontoam-se
carros nos troços mais isolados do caminho, montam-se bancadas com fruta e
bebidas quentes. O peregrino já não vai ao supermercado, a comida vai ao peregrino.
O comércio, a economia, os serviços, etc, tudo se desenvolve para fornecer
todos as necessidades ao ser humano, inclusive empresas que transportam as
mochilas entre albergues.
A
concorrência é feroz, Agés há 11 anos nem se notava, hoje, o “chamamento
visual” era tanto que me questionei porque não me lembrava desta povoação no
passado?
27Set
Cardeñuela Rio Pico-Tordesilhas-Salamanca_Ciudad Rodrigo-Sabugal-Castelo Branco
Em
Burgos sempre senti frio. Os 4graus sentem-se essencialmente nos dedos das
mãos, a bicicleta não rola mais rápido para não intensificar o desconforto.
Não
tarda haverá sol, será um boa notícia e julgo que o melhor que vou ter nestes
dias de grande monotonia na N620 até Salamanca. Este “corredor” com campos de
cultivo de ambos os lados parece não ter fim, há 2 dias que aqui ando. O vento
que sopra sempre mais forte ao final da tarde, reduz para 1/3 a minha
velocidade, a chuva e o frio compõem o resto do retrato. Não quero continuar,
despachei a minha autonomia, já não transporto a tenda nem o fogão e por isso
estou mais vulnerável.
Valladolid
é oásis, um bálsamo para atenuar esta tortura. Sem grande inspiração, já estou
novamente a rolar. Passa do meio-dia quando o levante toma força e sopra forte
contra todo o espaço que ocupo. É tarde, são 19h e sei que não vou chegar à
mítica praça de Salamanca, avanço muito lentamente e ainda vejo o número 51
escarrapachado na tabuleta. Não há indicação de distância para as próximas povoações, pergunto na bomba de
gasolina onde posso encontrar sítio para dormir. Nesta estrada, a 10 km,
dizem-me. Cheguei a Parada de Rubiales e
aqui dizem-me para procurar na povoação seguinte.
“Grão a grão… Os habitantes percebem o meu
dilema e é diretamente com o Alcaide que falo. Não está fácil a conversação, há
um albergue (uma casa nova), mas falta um papel que autorize a sua utilização.
Alego que como recurso vou para a paragem de autocarros e então consigo o que
eles chamam de punto limpo.Não me orgulho e também não me envergonho do espaço
que me facultaram para dormir. Por respeito a quem me está a ler, não o irei
descrever
Domingo,
o problema de sempre, até os Hostal estão fechados. Qualquer pessoa gosta de
ajudar e por isso, com uma simples pergunta tenho várias opções onde me
dirigir.Nesta cidade não falta alojamento, é imponente com a sua fortaleza e a
torre de vigia usada no tempo das conquistas e que ainda hoje conserva as
marcas nas pedras da artilharia inimiga.
29Set
Ciudad Rodrigo-Alfaiates-Nave-Sabugal-Meimão-Penamacor
Uma neblina forte e mais uma estrada sem nada nem ninguém, um deslocamento firme e isolado por terras espanholas sempre com olho na quilometragem que falta para entrar no meu país.
Uma neblina forte e mais uma estrada sem nada nem ninguém, um deslocamento firme e isolado por terras espanholas sempre com olho na quilometragem que falta para entrar no meu país.
Uma
pequena placa marca o território que delimita Portugal. Já não vejo os enormes
obeliscos de Itália ou passo sob os gigantes arcos do triunfo da França, esta
é, para mim, a mais forte das memórias. Uma estrada singela para um grandioso
território carregado de história e tradição. Foi isso que num jantar com
canadianos, polacos, espanhóis e franceses lhes mostrei: O homem do Quebec
disse que defendia muito bem o meu país. Respondi que ninguém melhor que um
soldado defende a sua Terra.
No
Sabugal como o primeiro frango assado do mês, cheguei cedo e parece que o céu
vai abrir para uma linda tarde de sol. Arranco, aproveito esta oportunidade e
chego um pouco mais à frente. Sigo um bom atalho na N233 e entro na reserva da
Serra da Malcata em direção a Meimão. Desço vertiginosamente para a povoação e
tenho de compensar subindo até chegar à cota da barragem para aí seguir o mais
plano possível por mais um desvio que me
permite poupar vários quilómetros.
Olho em redor e parece não oferecer perigo a
não ser quando chego a um pequeno ribeiro a transbordar de água (notava-se que
tinha chovido muito em Portugal nos últimos dias). Filmo para logo ter de parar
porque a bicicleta está a ser arrastada, preciso das 2 mãos e concentração para
passar este obstáculo em segurança.
Penamacor
está mesmo ali, para entrar na vila, seja qual for a opção vai ser preciso suar
para chegar ao seu centro. Quem sabe os bombeiros me ajudam e deixam colocar o
saco-cama num pequeno espaço, pensei. A 2 metros do quartel indago a um
transeunte se ali seria o edifício da corporação. Recebi um sim pouco
convincente mesmo antes de entrar no edifício. A minha intuição dizia-me que
este não era o mais simpático dos habitantes da terra e por isso, dirigi-me à
secretaria.
-
Sou peregrino, venho de Roma e vou para Fátima, há espaço para colocar o
saco-cama?
O
presidente é precisamente o homem com quem me cruzei na rua. Pouca sorte,
alguém antes de mim roubou um fato de bombeiro e condenou para sempre a
possibilidade de alguém ali ficar a descansar.
30Set Penamacor-Vila de Rei
01Out Vila de Rei-Castelo Branco
A solução que apresento passa por manter a alvorada ao nascer do sol, sair cedo e escolher bem o itinerário. Vale de Ovelhas aparece numa placa, este era um desvio escolhido por ser a terra natal do Rui. Por caminhos de muita terra batida e pedra chegamos à casa rodeada de árvores de fruto que não negamos em provar. Não foi preciso muito para entrarmos num café próximo, é sempre bom saber as novidades da aldeia e debater o melhor caminho para a bicicleta com quem em tempos foi o taxista de serviço daquele lugar.
02Out Vila Rei- Fátima
Pouca sorte ou falta de
vontade ditaram que fosse procurar alojamento local. Fiquei muito bem instalado
numa casa de turismo rural, para lá da janela a serra não me impedia de
continuar a ver todos os caminhos que tinha percorrido desde Roma.
As contrariedades não
afetam o meu estado de espirito, deambulo pelas ruas ingremes desta cidade em
busca da melhor ementa nos restaurantes locais. Tenho saudades de acompanhar
uma refeição com uma bela garrafa de
vinho, neste caso, se o fizer longe do alojamento, sei que vou ter
complicações. Opto pelo meu momento zen e mais uma vez escolho o menu no
supermercado, levo a garrafa e deixo-me estar em paz.
30Set Penamacor-Vila de Rei
Hoje tinha uma surpresa, o Rui ia fazer-me
companhia. Vinha de Lisboa no Intercidades com a sua bicicleta, juntos íamos
fazer as últimas etapas. A sua rede de contatos bem como o conhecimento da zona
substituíam bem o gps. Em Castelo Branco fomos acolhidos de braços abertos
pelos primos do Rui e eu sou o novo elemento da família que se reune para
jantar e conversar sobre as aventuras do dia. Eis que chega o momento de
descansar, o jovem casal faz questão de me oferecer o seu quarto,transponho a
porta e o meu primeiro pensamento foi: “que belos tapetes para colocar o
saco-cama.”
01Out Vila de Rei-Castelo Branco
O meu novo companheiro
de viagem receia atrasar-me e continua com dúvidas se irá ultrapassar esta
odisseia pois não sabe se vai aguentar a quilometragem diária e ainda tem a
somar a questão de ter os dias contados para esta mini-aventura.
A solução que apresento passa por manter a alvorada ao nascer do sol, sair cedo e escolher bem o itinerário. Vale de Ovelhas aparece numa placa, este era um desvio escolhido por ser a terra natal do Rui. Por caminhos de muita terra batida e pedra chegamos à casa rodeada de árvores de fruto que não negamos em provar. Não foi preciso muito para entrarmos num café próximo, é sempre bom saber as novidades da aldeia e debater o melhor caminho para a bicicleta com quem em tempos foi o taxista de serviço daquele lugar.
Vila de Rei está bem no
centro de Portugal mas acreditem que o horizonte que nos é permtido avistar
pouco tem de plano. É na verdade uma prova de superação para o Rui à medida que
avança, lentamente, a subir e a torrar ao sol. As paragens são estratégicas e
são elas que nos permitem novo fôlego, não vale contar as horas, não vale
contar os quilómetros. Estamos com sentido de missão, Fátima não é assim tão
longe.
02Out Vila Rei- Fátima
Estávamos numa região
outrora fustigada pelos fogos florestais mas a sirene não tocou no quartel dos
bombeiros onde passámos a noite.
O Rui não
facilitou,consigo transportava tudo o que pensava vir a utlizar,mesmo sabendo
que era por poucos dias. Obviamente que trazia excesso de bagagem e isso só lhe
era favorável a descer onde passava por mim sempre sorridente. Por vezes ainda
me questionava se faltava muito para a subida acabar, eu olhava o gps e como
forma de motivação nunca me aproximava muito da verdade. É uma técnica que
resulta, em esforço o sangue não parece oxigenar muito o cérebro e por isso
saio sempre ileso nas palavras que pronuncio.
Parece que tudo vai a
caminho de Fátima.São carros, camiões e tractores com atrelado, são vários os
momentos em que na frente vai uma bicicleta a chefiar a coluna. Divirto-me a
fotografar e a combinar pelo telemóvel uma hora provável de chegada ao
Santuário. Espera-nos uma equipa de reportagem para que possamos enumerar o que
nos move.
Indepentementeda
estrada escolhida, a subida está lá. Qualquer casa, qualquer árvore ou objecto
que projecte sombra é um bom sítio para descansar. Parados na soleira de uma
porta somos abordados pela presença dos donos da casa que nos abonam com água
bem fresca. Neste espaço tão perto do sagrado devem avistar muitos peregrinos,
sabem que aquele momento não será esquecido, que com um gesto tão simples estão
a ganhar um lugar no céu.
Os ponteiros do relógio
mexem-se, o telemóvel toca, do outro lado a jornalista pergunta se ainda
estamos longe e se chegamos à hora combinada. Depende das pernas – respondo eu.
Ela não sabia que nós já tínhamos feito um desvio de
10 km para a estacão de Caxarias (onde ficou toda a bagagem) e era para aqui
que iríamos regressar depois da entrevista para apanharmos o comboio para
Lisboa.
Não chegámos com a pontualidade britânica mas
naquela praça tudo terminou em beleza e em paz. O nosso objectivo tinha
terminado mas a totalidade do esforço não se tinha esgotado por ali, ainda era
preciso regressar, a pedalar.
- Vamos à estação de camionagem, metemos as bikes no
autocarro – diz o Rui.
Na estação
dos autocarros. - Vocês, ciclistas, são engraçados, pedalam centenas de
quilómetros e depois querem regressar no autocarro por causa de uma distância
pequena. A camioneta vai cheia, não vamos ter lugar.
Resignados, metemos umas moedas na máquina das
bebidas e bebemos uma bebida energética.
Deixámos de ser
peregrinos e tornámo-nos “sumólicos”. A estrada não terminou ali
Epílogo
Que
interessa onde me levou esta viagem? A maioria das vezes nem me lembro dos
nomes dos locais por onde passei e houve momentos em que perdi a noção do que
estava a fazer. Tudo faz sentido quando é em mim que viajo,em redor do meu
mundo.
Cada
um deve procurar seguir a sua própria viagem com diz o Gonçalo Cadilhe. Ela
surge naturalmente quando nos revisitamos em busca de novas respostas e nos
conduz para dentro de um jogo de transformação facilitado pela estrada.
Estas
são palavras escritas. Mais tarde podem ser contadas, no entanto, continuarão a
ser palavras que passam, não se tornam parte da minha vida. Quando se sobrepõem
às fotos e à experiência que passei, elas passam a habitar-me. A partir desse
instante, eu mudei.
Todos
somos peregrinos, pessoas num processo dinâmico. A cada um o seu Evereste, ao
seu ritmo, a trilhar o destino que é só seu. Este sou eu a enfrentar as minhas
montanhas e esta continua a ser parte da minha história. “Vene Vini Vinci”
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